24 de março de 2010

EM PAUTA - O novo CPC e minhas memórias em ebulição

No Twitter, sigo o processualista José Miguel Garcia Medina (@ProfMedina), um dos componentes da comissão formada para a elaboração do "novo CPC". Todos os dias, portanto, tomo conhecimento de notícias relacionadas ao trabalho.
Seja no site de relacionamento citado, seja em qual for o meio de comunicação, tem-se ressaltado aquilo que promete ser uma das mais significativas mudanças nessa nova legislação processual, ao que chamam de incidente de coletivização dos litígios em massa.
Ao que parece, teremos de forma mais ampla aquilo que já vinha acontecendo perante os Tribunais Superiores.
O Judiciário parece estar cansado de falar sobre a mesma coisa, e agora, quando estiver diante de causas repetitivas, não vai mais se debruçar sobra cada uma. Proferirá uma única decisão que irradiará efeitos para todas as outras causas que ficaram sobrestadas.
Nesse sentido, já vêm alertando os juristas encarregados da labuta. Veja-se o excerto de um artigo de Luiz Fux, retirado do site do Prof. Medina:

[...] construiu-se a proposta de instituição de um incidente de coletivização dos denominados litígios de massa, o qual evitará a multiplicação das demandas, na medida em que o seu reconhecimento numa causa representativa de milhares de outras idênticas, imporá a suspensão de todas, habilitando o magistrado na ação primeira, dotada de amplíssima defesa, com todos os recursos previstos nas leis processuais, proferir uma decisão com largo espectro, definindo o direito controvertido de tantos quantos se encontram na mesma situação jurídica, trazendo uma solução de mérito consagradora do princípio da isonomia constitucional. [...]

Como eu disse, isso é parecido ao que já vem se esboçando perante os Tribunais Superiores, seja quando da auferição da repercussão geral, seja quando do processamento de Recursos Especiais ditos repetitivos.
Engraçado é que na minha monografia, defendida num passado não tão distante, eu tratei justamente dessa "onda" de querer encurtar o trabalho do Judiciário, usando-se daquilo que chamei de "julgamento por amostragem".
Quando da defesa oral, eu disse:

"Não vou criticar, porque as reformas na sistemática recursal são compreensíveis. O nosso Judiciário passa por uma crise, e são necessárias soluções no sentido de desafogá-lo. Mas não podemos fechar os olhos para as complicações que esse "julgamento por amostragem" traz. Por isso, pari passu a estas reformas, devemos procurar mecanismos para legitimiar a atuação jurisdicional".

Naquela oportunidade (e, aliás, era este o núcleo rígido do meu trabalho) eu apresentava e investigava a figura do amicus curiae.
Depois da explanação, fui submetido às indagações da banca. O primeiro examinador, o Exmo Sr. Dr. Juiz de Direito Marco Antônio Lobo Castelo Branco, questionou, em síntese, o seguinte:

"Rafael, você tratou da figura do amicus em âmbito recursal, já lá no STF e STJ. Mas, e quais suas perspectivas pro futuro? Você acha que, um dia, será possível a admissão deste instituto também em primeiro grau?"

A minha resposta foi positiva, apesar de ainda não ter em mente as ideias que hoje são traçadas pela comissão do novo CPC.
O dia parece se aproximar cada vez mais, não?
Afinal, alguém duvida que realmente até o nosso Judiciário gosta de imitar os norte americanos?
Ok, eu não vou criticar.
Mas, com uma condição: está na hora de desvendarmos definitivamente a figura do amicus curiae, não?
Afinal, ele será amigo não apenas da Corte, mas de todos nós num futuro próximo. Será um amigo da DEMOCRACIA.

4 comentários:

Unknown disse...

Enquanto lia o teu texto me preparava mentalmente para fazer um comentário de teor semelhante a conversas que tive com Gisele Fontes em curso ministrado ao TJE/PA.
Coincidentemente, escreveste quase ao final uma frase que parece se aproximar do que ando refletindo sobre o direito brasileiro: estamos vivendo um momento de profundas transformações, dogmáticas, inclusive. Pra quem ainda não percebeu, vivemos no Direito Brasileiro a zona cinzenta do abandono do civil law, para a adoção definitiva do common law, imitando os norte americanos...
Mas, como bem disse a querida mestra citada, as acedemias brasileiras precisam, urgentemente, se adaptar à nova realidade e inserir significativas mudanças de enfoque, pois o jurista brasileiro não está preparado para discutir o Novo Direito Brasileiro. Falta-nos verdadeiro conhecimento de hermenêutica jurídica (tema sugerido à minha querida estagiária, Jéssika).

Rafael Albuquerque disse...

Dr. Amyntor, obrigado pelo comentário mais uma vez pertinente (como lhe é de praxe).
Realmente nosso Judiciário já vem, há tempos, passando por uma transformação significativa, e esse novo CPC é apenas uma constatação. Mais lisérgica, mas é...
Tudo o que é novo assusta, e deixa-nos cheio de perguntas e dúvidas.
Também tive uma recente conversa com a Prof. Gisele Gato, e também discutíamos o novo CPC, e ela bateu num ponto bastante pertinente.
Como preparar os servidores públicos? Como os secretários, oficiais, diretores etc, de todas as partes desse Brasil, poderão se atualizar de acordo com essas profundas reformas? É complicado...
Vamos ver no que vai dar. Enquanto isso, só nos cabe estudar e discutir o que vem sendo proposto.
Prometo botar mais posts referentes ao novo CPC, para que possamos continuar discutindo.
Forte abraço!

Anônimo disse...

Olá Dr. Rafael !!

ainda não tinha reparado neste post super interessante. Concordo com você que as ciências jurídicas têm avançado em passos largos na busca de uma aplicação do direito mais adequada a realidade social em que vivemos, mas deveras como comentou Dr. Amyrton as academias, ainda são relutante em aceitar está realidade e continuam a reproduzir conhecimentos jurídicos já postos, esquecendo-se desta forma que o direito é fato social e neste sentido deve acompanhar a evolução da sociedade, não se limitando apenas a subsunção lógico-axiológica-formal da norma ao caso concreto, pois corre o risco de tornar-se apenas uma retórica e não se concretizar de forma efetiva. É como afirma Eros Roberto Grau : " a norma jurídica encontra-se em estado pontencial envolucrada, e é o interprete que a desnuda".Isso significa que a norma jurídica só ganha efetiva concreção quando esta se defronta com a realidade social.

Abraços

Higo Tavares

Rafael Albuquerque disse...

Só me resta concordar com todos! Rs