22 de abril de 2010

DESCOMPLICANDO 1 - CAPACIDADE: Visões material e processual


Quando nos pomos a estudar a capacidade em âmbito processual, é imprescindível que relembremos algumas lições passadas na disciplina Direito Civil.


Como nós sabemos, as pessoas são sujeitos que possuem o atributo jurídico da personalidade. A personalidade é a aptidão que as pessoas têm, portanto, de contrair direitos e adquirir obrigações. As pessoas físicas (ou naturais) adquirem a personalidade a partir do nascimento com vida, apesar da lei já por a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro (CC, art. 2º). Já as pessoas jurídicas (privadas) adquirem a personalidade a partir do seu respectivo registro no órgão competente.


A personalidade está ligada com a titularidade de direitos e de obrigações, ou seja, de se adquirir e se tornar titular destes. A partir daí, passa-se a questionar a possibilidade de exercê-los, e quando analisamos o exercício, voltamos atenção para o que chamamos de capacidade. A capacidade, portanto, é a possibilidade de exercer direitos e responder por seus deveres. Assim podemos estabelecer o esquema mínimo:






A capacidade se divide em dois conceitos técnicos:


a) Capacidade Jurídica (ou de direito): aquela que toda pessoa tem. É pessoa, nasceu com vida, tem personalidade, pode contrair direitos e obrigações e, por isso, pode exercê-los, ou seja, tem capacidade jurídica.


b) Capacidade de fato (ou de exercício): é a possibilidade de exercer pessoalmente os direitos conferidos, bem como responder pelas obrigações impostas. Essa capacidade nem todo mundo tem. Algumas pessoas não podem exercer pessoalmente os atos da vida civil. Por ser assim, a capacidade de fato (ou de exercício) permite dois estágios distintos. Pessoa capaz e pessoa incapaz.


A pessoa incapaz pode exercer os seus direitos e responder pelas suas obrigações, pois ela tem capacidade jurídica, mas ela não pode exercê-los pessoalmente, já que não tem a capacidade de fato.


Essa incapacidade pode ser absoluta ou relativa. O absolutamente incapaz (CC, art. 3º) não pode exercer quaisquer atos sozinho, devendo, por isso, ser representado. Já o relativamente incapaz (CC, art. 4º) pode exercer certos atos até certa medida, devendo ser simplesmente assistido.


Feitas essas considerações do Direito Civil no que tange à capacidade, podemos, agora, analisar esse assunto sobre o prisma processual, o que se faz com uma simples associação. A capacidade jurídica (ou de direito), no processo civil é chamada de capacidade de ser parte. Já a capacidade de fato (ou de exercício) é chamada, no processo civil, de capacidade processual.



A capacidade de ser parte, portanto, é a possibilidade de ser autor ou réu num processo, ou seja, estar em juízo defendendo um direito seu ou, mesmo, respondendo à demanda proposta por outrem.


Já a capacidade processual é a possibilidade de estar em juízo pessoalmente. Se a parte é incapaz do ponto de vista material, será também incapaz do ponto de vista processual, ao que deverá ser representado ou assistido no processo.


Assim, podemos afirmar que um menor de 16 (dezesseis) anos – absolutamente incapaz – poderá ser autor ou réu de um processo, porque ele tem capacidade de ser parte. Mas ele deverá estar legalmente representado naquele processo, porque ele não tem capacidade processual. Um pródigo, por sua vez, que é relativamente incapaz, também pode ser autor ou réu, mas deverá estar assistido.


Urge ressaltar que se o incapaz não tiver representante legal ou, se tendo, os interesses entre eles são conflitantes, o juiz deverá nomear um curador especial (CPC, art. 9º, I).


2.1. Vício da incapacidade processual (CPC, art. 13): se, num processo, ficar caracterizada a incapacidade processual ou, eventualmente, a irregularidade na representação, o juiz deverá suspender o processo e marcar um prazo razoável para que a parte sane o defeito. Se não houver a regularização do vício, após o transcurso do prazo, o juiz decretará a nulidade do processo (caso a providência cabia ao autor), declarará a revelia do réu (se a este cabia a correção), ou excluirá o terceiro da lide (se um terceiro interveniente é quem deveria sanar o vício detectado).

6 comentários:

Higo Tavares disse...

oie Rafael.
adorei o teu Blog.Realmente apresenta tematicas pertinentes e consistentes e o melhor com uma linguagem super acessivel e didática. sempre que posso entro pra atualizar meus conhecimentos. Adorei o post sobre os sistemas de valoração da prova e o mais recente sobre capacidade, mas você me encutiu uma dúvida, alguns doutrinadores ao explicarem a capacidade jurídica afirmam que ela é estática, pois você não poder exircitar os direitos que detem, mas no em seu post você você afirma que podemos exercê-los. Será que estou fazendo uma leitura equivocada??? abraços e sucesso. higo

Rafael Albuquerque disse...

Higo, muito obrigado pela visita e pela suscitação interessantíssima.
Confesso que gostaria de saber qual o autor que você leu, o qual adjetiva a capacidade jurídica de estática.
Restou-me pequena dúvida na argumentação do autor do qual você apresentou a ideia.
Com venia às correntes independentes, a capacidade se liga, indubitavelmente, ao exercício dos direitos adquiridos pelas pessoas, os quais só ganham significado se puderem ser exercitados. Assim, entendo que todas as pessoas possuem, sim, a capacidade de exercitar direitos e defesas, a qual se chama de capacidade jurídica.
Aguardo sua "réplica" para darmos continuidade à discussão.

Unknown disse...

Rafael, talvez seu leitor Higo esteja relacionando à regra da pessoa, inobstante a capacidade jurídica, não deter capacidade postulatória, para pessoalmente exercer seus direitos em juízo, sendo necessária a representação por advogado... Essa seria a única forma, a meu ver, para se afirmar que, de alguma forma, a capacidade jurídica seria estática, salvo (obviamente) as exceções que dispensam a capacidade postulatória exclusiva dos advogados.
Deixe-nos atualizados sobre essa colocação.

Rafael Albuquerque disse...

Pode ser que seja essa a visão empregada pelo ambientalista Higo. Diante da boa lembrança traçada pelo Amyntor, é bom fazer a seguinte consideração, como forma de complementar o texto escrito:

Não devemos confundir as espécies de capacidade tratadas na postagem com a chamada capacidade postulatória. Esta retrata a possibilidade de fazer pedidos, postulações, requerimentos etc. em juízo, e é exclusiva do advogado. Isso significa que as partes devem estar acompanhadas de advogado num processo, porque apenas a este cabe a possibilidade de postular, perante o Estado-juiz, as pretensões da parte que defende. (CF, art. 133; Lei nº. 8.906/94, art. 1º, I). Importante ressaltar que, são considerados INEXISTENTES os atos praticados pela parte sem estar devidamente representada por um advogado (CPC, art. 37). Apenas em raros casos é que a presença do advogado é dispensável, como por exemplo no Juizado Especial e na impetração de habeas corpus.

Continuemos aguardando mais colaborações para que essa discussão prossiga!

Anônimo disse...

olá, Drª Rafael !!!

Como sempre seu blog está maravilhoso e repleto de informações que nos deixam sempre bem atualizados. Mas voltando a nossa discussão quero dizer de antemão que são pertinentes e elucidativas as explicações dos posts anteriores,e deveras como fez alusão Amyntor me reportava ao fato de que embora algumas pessoas detenham capacidade de direito, ou seja, são detentoras direitos latentes ficam impossibilitadas de exercê-los por com própria.É neste diapasão que me reporto quando afirmo que a capacidade de direito é estática, tendo em vista que apesar de possuir direitos latentes algumas pessoas como os relativamente incapazes ficam impossibilitados de exercitá-los por conta própria. E para elucidar a ainda mais nossa discurssão e com a devida venia irei transcrever o trecho do artigo jurídico que li, onde se encontra esta afirmação: " A capacidade de direito a todos é atribuída sem distinção, pelo fato de ser pessoa.É uma posição estática e latente.já a capacidade de fato é uma posição dinânmica, entendida como o poder de movimentar aqueles direitos latentes através de atuação própria."( Ézio Luiz Pereira, revista Prática jurídica).
Querido gostaria de felicitá-lo pela brilhante iniciativa do blog, que além de nos brindar com informações de extrema relevancia, abre esse espaço importantíssimo para que possamos discutir sobre temas do universo jurídico. abraços =]
Higo Tavares

Rafael Albuquerque disse...

Saudações, Higo. Obrigado pela interferência mais uma vez. Fico feliz que o propósito principal desse Blog esteja surtindo efeitos: a discussão de assuntos jurídicos com o escopo de acrescentar-nos conhecimento.

Bem, ao ler o trecho que você transcreveu, acredito ter captado a intenção do autor...

Ao afirmar que a capacidade de direito é estática, significa dizer, de fato, que toda pessoa a possui. Não importa, para a capacidade de direito, a condição da pessoa. Ela sempre terá a capacidade de exercitar os seus direitos. Isso é estático justamente porque não muda, independentemente das reais condições daquela pessoa.

Com a capacidade de fato a coisa é diferente, pois uma pessoa só a terá se for, realmente, plenamente capaz. Se não for, não terá a capacidade de fato, ainda que tenha a capacidade de direito. Daí, por termos que analisar a condição da pessoa para apurar se ela tem ou não capacidade de fato, é que afirmamos ser esta dinâmica, pois oscila de caso para caso.